DONA MILITANA É
ROMANCEIRA POTIGUAR
Autora: Rosa Regis
Meu Bom Deus do Universo
Venha aqui me orientar
Para que eu, rimando em versos,
Possa, em cordel, contar
A história de uma dama
Que o Rio Grande conclama
Romanceira Potiguar.
No alto do Canaã,
São Gonçalo do Amarante,
Mora a dama romanceira
Do Medieval amante,
Que canta o que herdou do pai.
Aos Oitenta e três não cai
O seu vozerio cantante.
São romances decorados:
Ibéricos, medievais,
Com histórias principescas
Populares que, ademais,
Se não fosse a romanceira
A cultura brasileira
Já não a teria mais.
Na era de 19
De março de 25
Nasceu Dona Militana
Que belas roupas, nem brinco
Seu pai não deixava usar,
Nem a deixava cantar.
Proibia-a, com afinco.
Santo Antônio dos Barreiros
Que hoje é do Potengi,
É sua terra natal.
Aprendeu cantar ali.
Como seu pai não deixava
Que cantasse, ela guardava.
Diz: Foi assim que aprendi.
Atanásio Salustino
Do Nascimento, seu pai,
Era figura folclórica
De São Gonçalo. E lhe sai
Militana, sendo herdeira,
Tornando-se a romanceira
Que o Brasil, conhecer, vai.
Porém Dona Militana
Só vai mesmo aparecer
Em público quando Deífilo
Gurgel , vindo a conhecer
O seu cantar, abismado,
Não pode deixar de lado
O que acabou de ver.
- Ela é fora de série!
Afirma ele, encantado.
- O folclore brasileiro
Estaria desfalcado
Sem o belo romanceio
De Militana. E anseio
Que valor lhe seja dado.
Alguns romances vieram,
Na era medieval,
Da Espanha. Não existem
Aqui nem em Portugal.
Ela diz: Meu pai cantava
E eu, atrás, escutava,
No meio do algodoal.
Militana canta histórias
De vinganças, de amor,
De príncipes, reis e princesas,
Duques, plebéias; de horror;
Num formato original,
Ou quase, do medieval,
Num canto quase louvor.
Canta romances, modinhas,
Coco, xácaras, moirão;
Toadas-de-boi, aboios,
Fandango... E o coração
De quem ouve o seu cantar
Acompanha a batucar
Transbordando de emoção.
Numa forma diferente
De contar velhas histórias,
Militana vai cantando
Suas antigas memórias
Que herdou do seu velho pai
E que, de herança, vai.
A ela, glórias e glórias!
Ela equivale a um elo
Perdido que se encontrou
Com a Europa das cruzadas.
Foi Tarik quem falou.
Uma fonte elementar
Da cultura popular
Que alguém, um dia, abordou
Já fez um especial
Com artistas nacionais:
Lázaro Ramos e Elba
Ramalho. Mas desiguais,
Injustos, os tratamentos.
Inclusive, os pagamentos
Com seus diferenciais.
Em Um, Nove, Nove Dois (1992)
Foi destaque nacional,
Com o CD triplo “Cantares”
Representando Natal
Em um projeto altaneiro.
São Paulo e Rio de Janeiro
Conhecem o seu cabedal.
Ao ser lançado o CD
Luxuoso e requintado,
Contracenou com Antônio
Da Nóbrega , considerado
Um bardo da poesia
Nordestina. Uma iguaria
Do Medieval herdado.
O projeto da Fundação
Cultural Hélio Galvão,
Tendo Candinha Bezerra
Em parceria. E vão
Com ela ao Rio e São Paulo,
Porém o luxo e o regalo
Foi tão somente ilusão.
Em Um, Nove, Nove, Oito(1998)
No “Festejando Cascudo”
Em São Paulo estava ela
Participando de tudo.
No Alberto Maranhão
Tem mais participação
Com mais e mais conteúdo.
O Elomar - em Vitória
Da Conquista, na Bahia,
Inspirado em Militana
Aos seus cantares se alia.
A África, a Europa e o Nordeste
Do Brasil, junta, e reveste
Com o novo som que cria.
Músico exótico e criativo,
No cantar de Militana
Inspira-se pra criar
A sua música baiana.
De Vitória da Conquista
É Elomar, grande artista
Que, ao Rio Grande se irmana.
Dona Militana encanta
Ao velho, ao jovem, à criança.
Quem a escuta cantando
Dos seus cantares não cansa.
São narrações de encantados,
De príncipes, de reinados
Que o medieval alcança.
Repertório variado
Sua cabeça carrega
Como um belo arquivo vivo
Que, com sabença, delega
E mostra aos estudiosos
E também aos curiosos.
Do que sabe não se nega.
Na sua simplicidade,
A fama não lhe subiu
À cabeça. Na verdade,
“Se é famosa, não sentiu”!
Meu canto me dá prazer!
Diz ela, a nos fornecer
O que do seu pai ouviu.
Alexandro Gurgel
O Jornalista, dizia
No ano 2004:
A sociedade devia
Unir-se para cobrar,
Pra Militana, o lugar
Que ela bem merecia.
Críticos e jornalistas,
Dos melhores do país,
Renderam-se aos encantos
De Militana, que diz,
Hoje, sentir-se esquecida
Por quem lhe prometeu vida
Bem melhor, bem mais feliz.
Abatida pela idade,
E com crises de pressão
Alta, Dona Militana,
Abrindo o seu coração,
Mostra-se, visivelmente,
Desgostosa, descontente,
Cortando a voz de emoção.
Os direitos autorais,
Os cachês não recebidos
Por participações em
Projetos desenvolvidos
Dentro e fora de Natal,
Faz que demonstre afinal,
Sentimentos ressentidos.
Unindo-se, alguns poetas
Da nossa SPVA
Comovidos com o que passa
A romanceira, vão lá
Uma visita fazer,
E vêem, mal podem crer,
O abandono em que ela está.
Maria José do Oiteiro
Como era conhecida
Guarda um acervo cultural
Do Medieval trazida
Militana deve estar
Pra cultura popular
Como o ouro pra jazida.
E é vendo a necessidade
De mostrá-la para o mundo
Que, quando fui convidada,
Não hesitei um segundo:
O mundo vai conhecê-la,
Em versos vou descrevê-la,
Com um carinho profundo.
Espero que o “Grande Deus
Da Cultura” possa ver
O que aqui foi escrito
E procure conhecer
O que ela tem na cabeça.
Eu alerto: - Não esqueça!
Pois só tendes a perder.
E pra Dona Militana
Mando a minha saudação,
Um abração apertado
Coração com coração.
Desculpe-me se esqueci
Algo, ou se omiti.
Não foi a minha intenção.
Fim